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DOI: 10.1055/s-0041-1726060
Transferência do grande dorsal para lesões anterossuperiores irreparáveis do manguito rotador: descrição de técnica cirúrgica[*]
Artikel in mehreren Sprachen: português | EnglishResumo
As lesões do manguito rotador do ombro podem ter diversas configurações, e são divididas e/ou classificadas conforme o tamanho da lesão, o tendão envolvido, suas combinações, e se existe a possibilidade de reparo. As lesões irreparáveis do subescapular, assim como as lesões irreparáveis anterossuperiores, podem gerar disfunção do ombro devido à perda dos depressores da cabeça umeral, o que causa dor e limitação funcional. Entre as alternativas terapêuticas estão as transferências miotendíneas, sendo a técnica de transferência do peitoral maior para a tuberosidade menor a mais estudada e difundida nas últimas décadas. No entanto, alguns estudos anatômicos sugerem que o grande dorsal seja uma alternativa mais adequada para o tratamento dessas lesões por apresentar vetores de força mais parecidos com os do subescapular, além de apresentar resultados promissores nas avaliações clínicas de curto seguimento. Este trabalho tem o objetivo de descrever a técnica cirúrgica desenvolvida para transferência do grande dorsal nas lesões irreparáveis do subescapular e anterossuperiores do manguito rotador.
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Palavras-chave
ombro/cirurgia - manguito rotador - transferência tendinosa - traumatismos dos tendõesIntrodução
As lesões do manguito rotador do ombro têm diversas configurações, e são classificadas conforme o tamanho da lesão, os tendões envolvidos, e sua reparabilidade.[1] [2] As lesões iniciais do subescapular podem passar despercebidas clinicamente, o que ocasiona o atraso do tratamento e a evolução para uma lesão retraída associada à degeneração gordurosa do ventre muscular, que, assim, se torna irreparável[1] Não é incomum sua associação com lesões da porção anterior do supraespinhal, que caracterizam o que se chama de lesões anterossuperiores.[3] Nesses casos, observa-se perda dos depressores da cabeça umeral, o que leva a uma instabilidade anterossuperior que gera dor e disfunção no ombro.[3]
As alternativas de tratamento cirúrgico para lesões irreparáveis do subescapular incluem as transferências musculares, como as do peitoral maior, do peitoral menor, e do grande dorsal[2] [4] Já para os pacientes que apresentam o quadro associado à osteoartrite glenoumeral, a artroplastia reversa deve ser a alternativa, pois atua tanto na resolução da degeneração articular quanto no tratamento da disfunção decorrente da lesão do manguito.[4]
A técnica mais estudada e difundida para o tratamento das lesões irreparáveis do subescapular é a transferência do peitoral maior para a tuberosidade menor, que apresenta resultados clínicos favoráveis e mantidos em longo prazo[1] [5] [6] [7] No entanto, estudos anatômicos mostram que o tendão do grande dorsal apresenta um vetor mais próximo ao do subescapular, por também se originar da parede posterior do tórax, diferentemente do peitoral maior, que se origina da parede anterior e apresenta vetor de força quase ortogonal ao da porção anterior do manguito rotador.[8] Em um estudo anatômico em cadáveres, Elhassan et al.[8] demonstraram que a transferência do grande dorsal em casos de lesões do subescapular é anatomicamente possível e com baixo risco de lesão nervosa. Dessa forma, a proposta deste trabalho é descrever a técnica cirúrgica desenvolvida pelo Grupo de Cirurgia do Ombro para transferência do grande dorsal nas lesões irreparáveis do subescapular e/ou lesões anterossuperiores irreparáveis do manguito rotador.
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Descrição da Técnica
Após realizar bloqueio regional interescalênico e anestesia geral, o paciente é posicionado em cadeira de praia com auxílio de apoio para o cotovelo. A abordagem deltopeitoral é realizada com incisão de aproximadamente 7cm na região anterior do ombro para a identificação da lesão irreparável do subescapular. O ligamento coracoacromial é preservado para evitar a migração anterossuperior da cabeça umeral e, se o cabo longo do bíceps estiver íntegro, a tenotomia com ou sem tenodese é realizada. O tendão do grande dorsal é identificado em posição distal ao subescapular, medial ao cabo longo do bíceps, e posterior ao peitoral maior. A tenotomia de 2 cm proximais do peitoral maior é efetuada ([Figura 1]) para exposição adequada da porção distal do grande dorsal, que muitas vezes tem uma inserção arciforme ([Figura 2]). Em seguida, descola-se o tendão do grande dorsal do redondo maior com auxílio de um descolador de freer. Essa etapa é importante, pois eventualmente os tendões têm uma inserção ou fáscia quase conjunta, e se o grande dorsal não for bem liberado do redondo maior, dificultará sua excursão proximal até a cabeça do úmero. Em seguida, é feita a desinserção do grande dorsal do úmero, por meio de um osteótomo delicado e afiado, e o preparo de um chip ósseo na sua porção proximal, com cuidado para não violar a inserção do redondo maior ([Figura 1]). Segue-se a coleta do tendão usando um bisturi de lâmina 15 adjacente ao osso, para não haver perda do enxerto. Nesse passo de coleta do enxerto, é importante que a porção distal da inserção do grande dorsal seja visualizada adequadamente para que não se finalize a coleta antes do seu final e, por consequência, se realize uma amputação da parte distal do enxerto, o que pode dificultar a excursão e qualidade do tendão no momento da inserção ([Figura 2]). depois, realiza-se o reparo do tendão do grande dorsal com dois pontos do tipo Krakow com fios inabsorvíveis (Ethibond 5, Ethicon, Inc., Cincinnati, Ohio, EUA) em cada borda do tendão, deixando a parte central livre, evitando algum prejuízo na vascularização e no potencial de cicatrização ([Figura 3]). Em seguida, realiza-se a liberação da parte muscular do enxerto com uma rugina romba do tipo Cobb para melhorar a excursão e o comprimento do tendão, cuidando-se para não colocar em risco as estruturas neurovasculares que se encontram mediais e anteriores ao grande dorsal, como o nervo radial. No próximo passo, testa-se a excursão do grande dorsal e delimita-se o ponto de inserção mais proximal. Então, o tubérculo menor e a porção mais anterior do tubérculo maior (nas lesões anterossuperiores) são decorticados com um saca-bocado, e é realizada a transferência do enxerto do grande dorsal e sua fixação com dois pontos transósseos no ponto mais proximal do leito decorticado do tubérculo menor, e, em alguns casos, na porção anterior do tubérculo maior ([Figura 4]). Mais alguns pontos transósseos são dados, fixando o tendão do grande dorsal à cabeça umeral se necessário, para que haja uma coaptação adequada do enxerto em sua maior superfície no leito ósseo. O coto do subescapular é reparado na borda medial ou sob o tendão do grande dorsal transferido, numa tentativa de melhorar a tensão da parede anterior do manguito. Caso haja possibilidade, é realizado o reparo de outras lesões de manguito (supraespinhal e infraespinhal) pela mesma via, também com pontos transósseos ([Figura 5]). Por fim, é feita a sutura da parte proximal do peitoral maior tenotomizado ([Vídeo 1]). Após o fechamento por planos e o curativo, o paciente é imobilizado com uma tipoia com coxim abdutor desenvolvida pelo Grupo de Cirurgia do Ombro para a manutenção do membro em posição neutra funcional. Um vídeo demonstrativo da técnica está no link a seguir ([Vídeo 1]).
Vídeo 1 Técnica de transferência do GD em caso de lesão anterossuperior do manguito rotador. Lesão irrepa-rável do subescapular e lesão reparável do supraespinhal. Vídeo em cores.
Qualität:
O manejo pós-operatório é feito com manutenção da tipoia por quatro a seis semanas. Durante esse período, o paciente é orientado a realizar a flexo-extensão do cotovelo com o braço ao lado do corpo já no primeiro dia de pós-operatório. Após a retirada da tipoia, orienta-se a realização de movimentos passivos, e o paciente evolui para mobilidade ativa. Exercícios de reforço muscular são recomendados apenas após a 12° semana de pós-operatório.
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Considerações Finais
A transferência do grande dorsal em lesões anterossuperiores irreparáveis do manguito rotador ([Vídeo 1]) é uma técnica nova que demonstrou ser viável, de baixo custo e sem complicações pós-operatórias em curto prazo. Além disso, pacientes tratados por essa técnica relataram alta taxa de satisfação, e também foi possível utilizá-la em pacientes que apresentavam lesões posterossuperiores associadas. Estudos futuros são necessários para a avaliação da eficácia e da reprodutibilidade da técnica quando comparada a outros métodos de tratamento, assim como seus resultados clínicos em longo prazo.
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Agradecimentos
Ao dr. Augusto Medaglia, pela elaboração e desenho das ilustrações referentes à técnica cirúrgica, e ao dr. Rodrigo Py Gonçalves Barreto, pela colaboração no processo de revisão e formatação do manuscrito.
* Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Grupo de Cirurgia do Ombro da Santa Casa de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil.
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Referências
- 1 Resch H, Povacz P, Ritter E, Matschi W. Transfer of the pectoralis major muscle for the treatment of irreparable rupture of the subscapularis tendon. J Bone Joint Surg Am 2000; 82 (03) 372-382
- 2 Omid R, Lee B. Tendon transfers for irreparable rotator cuff tears. J Am Acad Orthop Surg 2013; 21 (08) 492-501
- 3 Kany J, Guinand R, Croutzet P, Valenti P, Werthel JD, Grimberg J. Arthroscopic-assisted latissimus dorsi transfer for subscapularis deficiency. Eur J Orthop Surg Traumatol 2016; 26 (03) 329-334
- 4 Greenspoon JA, Petri M, Warth RJ, Millett PJ. Massive rotator cuff tears: pathomechanics, current treatment options, and clinical outcomes. J Shoulder Elbow Surg 2015; 24 (09) 1493-1505
- 5 Konrad GG, Sudkamp NP, Kreuz PC, Jolly JT, McMahon PJ, Debski RE. Pectoralis major tendon transfers above or underneath the conjoint tendon in subscapularis-deficient shoulders. An in vitro biomechanical analysis. J Bone Joint Surg Am 2007; 89 (11) 2477-2484
- 6 Moroder P, Schulz E, Mitterer M, Plachel F, Resch H, Lederer S. Long-Term Outcome After Pectoralis Major Transfer for Irreparable Anterosuperior Rotator Cuff Tears. J Bone Joint Surg Am 2017; 99 (03) 239-245
- 7 Elhassan B, Ozbaydar M, Massimini D, Diller D, Higgins L, Warner JJ. Transfer of pectoralis major for the treatment of irreparable tears of subscapularis: does it work?. J Bone Joint Surg Br 2008; 90 (08) 1059-1065
- 8 Elhassan B, Christensen TJ, Wagner ER. Feasibility of latissimus and teres major transfer to reconstruct irreparable subscapularis tendon tear: an anatomic study. J Shoulder Elbow Surg 2014; 23 (04) 492-499
Endereço para correspondência
Publikationsverlauf
Eingereicht: 30. Juli 2020
Angenommen: 28. Oktober 2020
Artikel online veröffentlicht:
28. Oktober 2021
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Referências
- 1 Resch H, Povacz P, Ritter E, Matschi W. Transfer of the pectoralis major muscle for the treatment of irreparable rupture of the subscapularis tendon. J Bone Joint Surg Am 2000; 82 (03) 372-382
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- 8 Elhassan B, Christensen TJ, Wagner ER. Feasibility of latissimus and teres major transfer to reconstruct irreparable subscapularis tendon tear: an anatomic study. J Shoulder Elbow Surg 2014; 23 (04) 492-499